sábado, 25 de maio de 2013

TÁTIL

Eu quero escrever, mas esta única sensação não sai de meus dedos, meu pescoço e meu peito, apenas isso absorve minha mente agora. Quero falar de outra coisa, pensar em outra coisa, sentir outra coisa, mas não consigo porque somente isso fica latejando entre meus olhos.
A sensação escorrega entre as paredes e gruda em mim. Um odor voluteia pelo ambiente enquanto vou tentando fugir da sombra que cega minha vista. É quase pesadelo e mesmo assim fico segurando a ponta dele, pois não quero que se vá, que se funda com o resquício da escuridão que se dissolve ao amanhecer.
Nunca houve pesadelo tal como esse, que se pretende que acabe, mas se implora que continue.
Então tocou minha mão, como antes tocara meu antebraço. Os dedos suaves e delicados ali pousados por alguns segundos, displicentemente, num gesto casual sem importância, no entanto tão calmamente excitante. Por um minuto meu coração parou de doer, serenou e voltou a bater reconfortado por um desejo que há muito não admitia.
A ilusão de reciprocidade foi perfeita. Como antes já havia sido.
Agora não mais.
E aí a confusão se instalou completamente em meu cérebro.
Fico perseguindo ideias repetidas num círculo fechado, como o louco num instituto antigo, trancado numa cela acolchoada. Ele vai bater a cabeça, contudo não vai se ferir. A alucinação persistirá porque o líquido precioso não foi derramado.
No entanto, isso nada quer dizer diante do que ocorre aqui neste momento.
O tempo ultrapassou sua própria barreira e ficou preso neste único instante, se repetindo quadro a quadro, diante destes olhos meus que não marejam mais, mas também não podem refletir nada do que se passa no interior deste que dizem ser meu corpo. Estes olhos esquisitos, que brilham como os dos outros, contudo, não conseguem expressar nada do que sinto.
O ritual vai se repetir. A rotina prosseguirá. Eu continuarei indo e vindo, lapidando os movimentos, as frases, as expressões para dar sentido ao desatino e normalidade ao que não posso evitar.
As sensações continuarão me perseguindo. Eu continuarei falando sobre todos os temas do mundo, enquanto o pesadelo se repete e se renova todos os dias que ainda preciso andar por este mundo. E dele não consigo largar, desse sonho tristemente ruim e insuportavelmente bom.
Estes meus dedos estranhos nunca deveriam tocar em sonhos personificados, em dias de outono, nem nas gotículas do tempo que compro para não esquecer de que preciso continuar no comando da batalha.

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