Têm dias que não sei falar da terra
gris. Me sobe um nó pela garganta e tranca ali tudo o que vejo e sinto. Nem a
caneta consegue traduzir o que me sufoca.
Têm dias que eu não consigo sequer
pensar em Rio Grande. Talvez seja porque, nessas ocasiões, o mar está se
debatendo, estrondoso, contra a Laguna dos Patos, na entrada da Barra, num
rebojo terrível que até poderia causar naufrágios. De fato, em outros tempos,
já causou. Destruiu naus, avançou sobre dunas, deixou no leito do canal malas
de passageiros e seus corpos, que nunca deram à praia.
Nesses dias de vento e mar
tresloucados ando pela cidade e me achego ao cais do Porto Velho. Fico a
observar o trabalho dos pescadores em seus barcos, que já não voltam tão cheios
como antes, sentindo a maresia agridoce que somente nesta cidadela pode
dispersar-se pelo ar. Não creio que seja possível existir outro lugar onde esse
cheiro possa ser reproduzido, ou ser considerado igual ao daqui, mesmo podendo
ser parecido.
E ando por vielas com mais de dois
séculos de existência, procurando algo que se torne meu ou me mantenha em minha
época. Mas é impossível. É que, às vezes, Rio Grande não é, assim como eu deixo
de ser, e simplesmente se torna um cais fantasma, sem barcos para aportar ou
partir.
Há dias assim, que a cidade gris
dói em mim de tal forma que, embora eu perceba alguma feiura neste chão, ainda
encontro outra coisa muito efêmera e até bela.
É que têm dias que eu não consigo,
de jeito nenhum, contar algo do Rio Grande, porque, nesses dias, não sou eu que
moro nela, mas é ela que habita em mim.
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