Pois é, cara, a coisa é assim.
Sabe como é. De repente tu te vê tendo que safar a cara de todo mundo. Assume
uma responsabilidade ali, outra lá e quando tu menos espera já foi encarregado
por todo mundo de arrumar a bagunça. Ninguém perguntou se tu queria a função,
se tu podias aguentar o tranco. Simplesmente te olharam e perceberam (não sei
de onde tiraram isso) que tu é o ‘CARA’, a pessoa que vai arranjar tudo,
botar a família nos eixos, nem que tenha que dar uns tabefes em um ou outro,
seja no sentido literal ou metafísico da coisa (embora eu não saiba muito bem o
que isso quer dizer).
E aí quanto tu percebe já tá dando conselho pra um,
emprestando grana pra outro arranjar a vida, pagando curso pro azarado que
nunca consegue ficar no trampo, ou tirando tua irmã das garras podres do
maridão espancador, mesmo sabendo que na próxima semana ela voltará pra ele ou
arranjará outro cara, de cara diferente, mas personalidade psicótica idêntica
ao anterior.
E os teus velhos só podem assistir a coisa, porque
os filhos já cresceram e não escutam mais os conselhos deles, até porque quando
foram dados, alguns foram mal fornecidos e o pai em vez de argumentar foi
enfiando um gancho direito no olho do teu brother. E a cara da tua mãe, que
queria impedir, mas não pode, ficou ali mareando tuas lembranças com a dor que
ela mostrava nos olhos e tu não conseguiu evitar que ela sentisse.
E tu, meio abestado, olhou a sangueira escorrendo
do supercílio do guri e pensou: “Coisa de loco”. E saiu já empurrando o velho
pra longe do espancado. Berrou com um, trancou o pai num quarto, acalmou a mãe,
etc, etc, etc.
É nesse instante que meio se congela no tempo que tu percebe tarde demais que a batalha ferveu, mas como tu acabou domesticando os ânimos a coisa foi arrefecendo e o núcleo familiar decidiu tácita e unanimemente que, dali para diante, tu seria o mediador das disputas, o solucionador dos dilemas, o ombro pra todas as horas e, com alguma sorte, se tu conseguisse te graduar em alguma coisa ou ter uma profissão que pagasse o suficiente tu irias arrumar a vida de todos até que eles estivessem no rumo certo e tu completamente bagunçado.
É nesse instante que meio se congela no tempo que tu percebe tarde demais que a batalha ferveu, mas como tu acabou domesticando os ânimos a coisa foi arrefecendo e o núcleo familiar decidiu tácita e unanimemente que, dali para diante, tu seria o mediador das disputas, o solucionador dos dilemas, o ombro pra todas as horas e, com alguma sorte, se tu conseguisse te graduar em alguma coisa ou ter uma profissão que pagasse o suficiente tu irias arrumar a vida de todos até que eles estivessem no rumo certo e tu completamente bagunçado.
Mas, alegam, valeria a pena, porque em cerca de 20
anos tu estaria livre da incumbência, teu pai morto, cedo ou tardiamente, já
não socaria a cara de nenhum de seus rebentos, tua irmã já estaria longe das
mãos de pseudo-amantes agressivos, teu sobrinho bem arranjado, teu outro irmão
ainda apanhando um pouco da vida, mas se encaminhando. Tudo muito bom, embora ainda
estivesses meio abestado...
E tu, bem, tu estaria aparentemente feliz, te
matando de trabalhar porque não conheces outra vida, ainda tentando bolar
planos de contingência para evitar futuras situações de risco para o bem
familiar e esperando... esperando um obrigada, ou apenas um simples abraço, que
nunca virá.
É simples assim. A vida continua. E ninguém percebe
que, enquanto todo mundo andou, só tu ficou lá, parado, olhando pra tudo que
foi feito, mudado, remediado, mas que não cicatrizou.
Mas não reclamo, não, cara. É a vida e é algo
simples assim.
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